O Brasil inteiro conhece as divergências entre os ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva. Também acompanha o duelo que o PSDB e o PT travam pelo poder central desde 1994. Os dois ex-presidentes e seus partidos dominam a cena política das últimas duas décadas.
Pessoas respeitáveis criticam a polarização PT-PSDB. Veem uma imposição ao debate público de uma contenda mais paulista do que brasileira. Acreditam que essa disputa causa ao país mais perdas do que ganhos. É importante discordar desse ponto de vista.
Essa polarização garantiu a eleição para a Presidência dos melhores quadros da atual geração de políticos. Os benefícios parecem superiores aos eventuais malefícios, como, supostamente, asfixiar o surgimento de novos líderes.
Aliás, quais novos líderes? Para defender o quê? O conservadorismo de alguns e de algumas chega a dar medo.
De volta aos dois ex-presidentes, FHC e Lula são responsáveis por reformas estruturais que, combinadas, resultaram no período de maior prosperidade de nossa história: mais abertura econômica, inflação baixa, renda em alta, quase pleno emprego, políticas sociais eficientes e inclusão de milhões de pessoas num mercado consumidor antes acessível a uma elite.
É fato que o Brasil mudou para melhor, apesar do longo percurso que falta até melhorar mesmo a saúde, a educação e a segurança pública.
Os eleitores entendem isso. Não são ingênuos manipuláveis por marqueteiros, políticos e jornalistas. Sabem o que desejam. Deram duas vitórias presidenciais a FHC em primeiro turno porque acreditaram que o programa apresentado pelo tucano era o mais adequado ao Brasil. Alçaram Lula à Presidência após duas tentativas frustradas porque queriam mais.
Reelegeram o petista e ainda atenderam ao seu pedido para fazer a sucessora, Dilma Rousseff.
O PSDB foi trocado pelo PT porque os eleitores enxergaram nas propostas petistas o caminho mais rápido para dar cidadania a milhões de pessoas. A moderação política e econômica do PT até hoje não foi bem entendida pelo PSDB. Dominado por cores lacerdistas, o discurso dos candidatos tucanos nas três últimas eleições presidenciais refletiu essa incapacidade de compreensão.
O PT não aceita que o PSDB lhe dirija a mesma cobrança moralista que o petismo exigia de todos os outros partidos no passado. O pragmatismo excessivo de setores petistas levou o partido a abusar de práticas que antes condenava.
Criou-se, assim, um estado de guerra quase permanente entre tucanos e petistas. Há pequenas tréguas, como a bonita e educadora fotografia que Lula e FHC tiraram quando o tucano visitou o petista no hospital.
2012 é ano de eleição. O saudável embate será inevitável. Mas Lula e FHC, os verdadeiros líderes de seus partidos, poderiam tentar estabelecer uma convivência mais civilizada, que tirasse do debate público propostas que seriam mais bem defendidas pela TPF e pela antiga Arena. Os dois deveriam congelar suas divergências. Deveriam se unir em torno de suas convergências para acelerar reformas necessárias ao país.
O caso Demóstenes Torres, senador por Goiás que se desfiliou do Democratas, é um exemplo perfeito da fragilidade dessa hipócrita agenda udenoide. Seria excelente se FHC e Lula se aliassem para ajudar o Brasil a ter uma política mais de causas do que de casos.
Kennedy Alencar escreve na Folha.com às sextas. Na rádio CBN, é titular da coluna "A Política Como Ela É", no "Jornal da CBN", às 8h55 de terças e quintas. Na RedeTV!, apresenta o "É Notícia", programa dominical de entrevista, e o "Tema Quente", atração diária com debate sobre assuntos da atualidade.
Um blog que traz informações e analisa criticamente as notícias de interesse dos xiquexiquenses. Ideal para você que não se satisfaz com o mero relato dos fatos e exige um aprofundamento sobre o que lê. Comprometido com o dever de fundamentar as conclusões a que chega, aceita como inevitável a parcialidade que deixa transparecer. Por isso está sempre aberto a críticas. Seja bem vindo. Boa leitura!
Mostrando postagens com marcador Folha de SP. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Folha de SP. Mostrar todas as postagens
sábado, 7 de abril de 2012
sexta-feira, 30 de março de 2012
Entrevista: Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que teve mais
medo de perder a voz do que de morrer após a descoberta do câncer na
laringe. "Se eu perdesse a voz, estaria morto."
Um dia depois da notícia de que o tumor desapareceu, ele recebeu a Folha para uma entrevista exclusiva num quarto do hospital Sírio Libanês, em São Paulo, onde faz sessões de fonoaudiologia.
Lula comparou a uma "bomba de Hiroshima" o tratamento que fez, com sessões de químio e radioterapia.
Ele emocionou-se ao lembrar da luta do vice-presidente José Alencar (1931-2011), que morreu de câncer há exatamente um ano. "Hoje é que eu tenho noção do que o Zé Alencar passou."
Quase 16 quilos mais magro e com a voz um pouco mais rouca que o normal, o ex-presidente ainda sente dor na garganta e diz que sonha com o dia em que poderá comer pão "com a casca dura".
A entrevista foi acompanhada por Roberto Kalil, seu médico pessoal e "guru", pelo fotógrafo Ricardo Stuckert e pelo presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto.
Folha - Como o sr. está?
Luiz Inácio Lula da Silva - O câncer está resolvido porque não existe mais aqui [aponta para a garganta]. Mas eu tenho que fazer tratamento por um tempo ainda. Tenho que manter a disciplina para evitar que aconteça alguma coisa. Aprendi que tanto quanto os médicos, tanto quanto as injeções, tanto quanto a quimioterapia, tanto quanto a radioterapia, a disciplina no tratamento, cumprir as normas que tem que cumprir, fazer as coisas corretamente, são condições básicas para a gente poder curar o câncer.
Foi difícil abrir mão...
Hoje é que eu tenho noção do que o Zé Alencar passou. [Fica com a voz embargada e os olhos marejados]. Eu, que convivi com ele tanto tempo, não tinha noção do que ele passou. A gente não sabe o que é pior, se a quimioterapia ou a radioterapia. Uns dizem que é a químio, outros que é a rádio. Para mim, os dois são um desastre. Um é uma bomba de Hiroshima e, o outro, eu nem sei que bomba é. Os dois são arrasadores.
O sr. teve medo?
A palavra correta não é medo. É um processo difícil de evitar, não tem uma única causa. As pessoas falam que é o cigarro [que causa a doença], falam que é um monte de coisa que dá, mas tá cheio de criancinha que nasce com câncer e não fuma.
Qual é a palavra correta?
A palavra correta... É uma doença que eu acho que é a mais delicada de todas. É avassaladora. Eu vim aqui com um tumor de 3 cm e de repente estava recebendo uma Hiroshima dentro de mim. [Em alguns momentos] Eu preferiria entrar em coma.
Kalil [interrompendo] - Pelo amor de Deus, presidente!
Em coma?
Eu falei para o Kalil: eu preferiria me trancar num freezer como um carpaccio. Sabe como se faz carpaccio? Você pega o contrafilé, tira a gordura, enrola a carne, amarra o barbante e coloca o contrafilé no freezer e, quando ele está congelado, você corta e faz o carpaccio. A minha vontade era me trancar no freezer e ficar congelado até...
Sentia dor?
Náusea, náusea. A boca não suporta nada, nada, nada, nada. A gente ouvindo as pessoas [que passam por um tratamento contra o câncer] falarem não tem dimensão do que estão sentindo.
Teve medo de morrer?
Eu tinha mais preocupação de perder a voz do que de morrer. Se eu perdesse a voz, estaria morto. Tem gente que fala que não tem medo de morrer, mas eu tenho. Se eu souber que a morte está na China, eu vou para a Bolívia.
O sr. acredita que existe alguma coisa depois da morte?
Eu acredito. Eu acredito que entre a vida que a gente conhece [e a morte] há muita coisa que ainda não compreendemos. Sou um homem que acredita que existam outras coisas que determinam a passagem nossa pela Terra. Sou um homem que acredita, que tem muita fé.
Mesmo assim, teve um medo grande?
Medo, medo, eu vivo com medo. Eu sou um medroso. Não venha me dizer: 'Não tenha medo da morte'. Porque eu me quero vivo. Uma vez ouvi meu amigo [o escritor] Ariano Suassuna dizer que ele chama a morte de Caetana e que, quando vê a Caetana, ele corre dela. Eu não quero ver a Caetana nem...
Qual foi o pior momento neste processo?
Foi quando eu soube. Vim trazer a minha mulher para um exame e a Marisa e o Kalil armaram uma arapuca e me colocaram no tal de PET [aparelho que rastreia tumores]. Eu tinha passado pelo otorrino, o otorrino tinha visto a minha garganta inflamada.
Eu já estava há 40 dias com a garganta inflamada e cada pessoa que eu encontrava me dava uma pastilha No Brasil, as pessoas têm o hábito de dar pastilha para a gente. Não tinha uma pessoa que eu encontrasse que não me desse uma pastilha: 'Essa aqui é boa, maravilhosa, essa é melhor'. Eu já tava cansado de chupar pastilha.
No dia do meu aniversário, eu disse: 'Kalil, vou levar a Marisa para fazer uns exames'. E viemos para cá. O rapaz fez o exame, fez a endoscopia, disse que estava muito inflamada a minha garganta. Aí inventaram essa história de eu fazer o PET. Eu não queria fazer, eu não tinha nada, pô. Aí eu fui fazer depois de xingar muito o Kalil.
Depois, fui para uma sala onde estava o Kalil e mais uns dez médicos. Eu senti um clima meio estranho. O Kalil estava com uma cara meio de chorar. Aí eu falei: 'Sabe de uma coisa? Vocês já foram na casa de alguém para comunicar a morte? Eu já fui. Então falem o que aconteceu, digam!' Aí me contaram que eu tinha um tumor. E eu disse: 'Então vamos tratar'.
Existia a possibilidade de operar o tumor, em vez de fazer o tratamento que o senhor fez.
Na realidade, isso nem foi discutido. Eles chegaram à conclusão de que tinha que fazer o que tinha que fazer para destruir o bicho [quimioterapia seguida de radioterapia], que era o mais certo. Eu disse: 'Vamos fazer'.
O meu papel, então, a partir dessa decisão, era cumprir, era obedecer, me submeter a todos os caprichos que a medicina exigia. Porque eu sabia que era assim. Não pode vacilar. Você não pode [dizer]: 'Hoje eu não quero, não tô com vontade'.
O senhor rezava, buscou ajuda espiritual?
Eu rezo muito, eu rezo muito, independentemente de estar doente.
Fez alguma promessa?
Não.
Existia também uma informação de que o senhor procurou ajuda do médium João de Deus.
Eu não procurei porque não conhecia as pessoas, mas várias pessoas me procuraram e eu sou muito agradecido. Várias pessoas vieram aqui, ainda hoje há várias pessoas me procurando. E todas as que me procurarem eu vou atender, conversar, porque eu acho que isso ajuda.
E como será a vida do sr. a partir de agora? Vai seguir com suas palestras?
Eu não quero tomar nenhuma decisão maluca. Eu ainda estou com a garganta muito dolorida, não posso dizer que estou normal porque, para comer, ainda dói.
Mas acho que entramos na fase em que, daqui a alguns dias, eu vou acordar e vou poder comer pão, sem fazer sopinha. Vou poder comer pão com aquela casca dura. Vai ser o dia!
Eu vou tomando as decisões com o tempo. Uma coisa eu tenho a certeza: eu não farei a agenda que já fiz. Nunca mais eu irei fazer a agenda alucinante e maluca que eu fiz nesses dez meses desde que eu deixei o governo. O que eu trabalhei entre março e outubro de 2011... Nós visitamos 30 e poucos países.
Eu não tenho mais vontade para isso, eu não vou fazer isso. Vou fazer menos coisas, com mais qualidade, participar das eleições de forma mais seletiva, ajudar a minha companheira Dilma [Rousseff] de forma mais seletiva, naquilo que ela entender que eu possa ajudar. Vou voltar mais tranquilo. O mundo não acaba na semana que vem.
Quando é que o senhor começa a participar da campanha de Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo?
Eu acho o Fernando Haddad o melhor candidato. São Paulo não pode continuar na mesmice de tantas e tantas décadas. Eu acho que ele vai surpreender muita gente. E desse negócio de surpreender muita gente eu sei. Muita gente dizia que a Dilma era um poste, que eu estava louco, que eu não entendia de política. Com o Fernando Haddad será a mesma coisa.
O senhor vai pedir à senadora Marta Suplicy para entrar na campanha dele também?
Eu acho que a Marta é uma militante política, ela está na campanha.
Tem falado com ela?
Falei com ela faz uns 15 dias. Ela me ligou para saber da saúde. Eu disse que, quando eu sarar, a gente vai conversar um monte.
E em 2014? O senhor volta a disputar a Presidência?
Para mim não tem 2014, 2018, 2022. Deixa eu contar uma coisa para vocês: eu acabei de deixar a Presidência da República, tem apenas um ano e quatro meses que eu deixei a Presidência.
Poucos brasileiros tiveram a sorte de passar pela Presidência da forma exitosa com que eu passei. E repetir o que eu fiz não será tarefa fácil. Eu sempre terei como adversário eu mesmo. Para que é que eu vou procurar sarna para me coçar se eu posso ajudar outras pessoas, posso trabalhar para outras pessoas?
E depois é o seguinte: você precisa esperar o tempo passar. Essas coisas você não decide agora. Um belo dia você não quer uma coisa, de repente se apresenta uma chance, você participa.
Mas a minha vontade agora é ajudar a minha companheira a ser a melhor presidenta, a trabalhar a reeleição dela. Eu digo sempre o seguinte: a Dilma só não será candidata à reeleição se ela não quiser. É direito dela, constitucional, de ser candidata a presidente da República. E eu terei imenso prazer de ser cabo eleitoral.
Um dia depois da notícia de que o tumor desapareceu, ele recebeu a Folha para uma entrevista exclusiva num quarto do hospital Sírio Libanês, em São Paulo, onde faz sessões de fonoaudiologia.
Lula comparou a uma "bomba de Hiroshima" o tratamento que fez, com sessões de químio e radioterapia.
Ele emocionou-se ao lembrar da luta do vice-presidente José Alencar (1931-2011), que morreu de câncer há exatamente um ano. "Hoje é que eu tenho noção do que o Zé Alencar passou."
Quase 16 quilos mais magro e com a voz um pouco mais rouca que o normal, o ex-presidente ainda sente dor na garganta e diz que sonha com o dia em que poderá comer pão "com a casca dura".
A entrevista foi acompanhada por Roberto Kalil, seu médico pessoal e "guru", pelo fotógrafo Ricardo Stuckert e pelo presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto.
Folha - Como o sr. está?
Luiz Inácio Lula da Silva - O câncer está resolvido porque não existe mais aqui [aponta para a garganta]. Mas eu tenho que fazer tratamento por um tempo ainda. Tenho que manter a disciplina para evitar que aconteça alguma coisa. Aprendi que tanto quanto os médicos, tanto quanto as injeções, tanto quanto a quimioterapia, tanto quanto a radioterapia, a disciplina no tratamento, cumprir as normas que tem que cumprir, fazer as coisas corretamente, são condições básicas para a gente poder curar o câncer.
Foi difícil abrir mão...
Hoje é que eu tenho noção do que o Zé Alencar passou. [Fica com a voz embargada e os olhos marejados]. Eu, que convivi com ele tanto tempo, não tinha noção do que ele passou. A gente não sabe o que é pior, se a quimioterapia ou a radioterapia. Uns dizem que é a químio, outros que é a rádio. Para mim, os dois são um desastre. Um é uma bomba de Hiroshima e, o outro, eu nem sei que bomba é. Os dois são arrasadores.
O sr. teve medo?
A palavra correta não é medo. É um processo difícil de evitar, não tem uma única causa. As pessoas falam que é o cigarro [que causa a doença], falam que é um monte de coisa que dá, mas tá cheio de criancinha que nasce com câncer e não fuma.
Qual é a palavra correta?
A palavra correta... É uma doença que eu acho que é a mais delicada de todas. É avassaladora. Eu vim aqui com um tumor de 3 cm e de repente estava recebendo uma Hiroshima dentro de mim. [Em alguns momentos] Eu preferiria entrar em coma.
Kalil [interrompendo] - Pelo amor de Deus, presidente!
Em coma?
Eu falei para o Kalil: eu preferiria me trancar num freezer como um carpaccio. Sabe como se faz carpaccio? Você pega o contrafilé, tira a gordura, enrola a carne, amarra o barbante e coloca o contrafilé no freezer e, quando ele está congelado, você corta e faz o carpaccio. A minha vontade era me trancar no freezer e ficar congelado até...
Sentia dor?
Náusea, náusea. A boca não suporta nada, nada, nada, nada. A gente ouvindo as pessoas [que passam por um tratamento contra o câncer] falarem não tem dimensão do que estão sentindo.
Teve medo de morrer?
Eu tinha mais preocupação de perder a voz do que de morrer. Se eu perdesse a voz, estaria morto. Tem gente que fala que não tem medo de morrer, mas eu tenho. Se eu souber que a morte está na China, eu vou para a Bolívia.
O sr. acredita que existe alguma coisa depois da morte?
Eu acredito. Eu acredito que entre a vida que a gente conhece [e a morte] há muita coisa que ainda não compreendemos. Sou um homem que acredita que existam outras coisas que determinam a passagem nossa pela Terra. Sou um homem que acredita, que tem muita fé.
Mesmo assim, teve um medo grande?
Medo, medo, eu vivo com medo. Eu sou um medroso. Não venha me dizer: 'Não tenha medo da morte'. Porque eu me quero vivo. Uma vez ouvi meu amigo [o escritor] Ariano Suassuna dizer que ele chama a morte de Caetana e que, quando vê a Caetana, ele corre dela. Eu não quero ver a Caetana nem...
Qual foi o pior momento neste processo?
Foi quando eu soube. Vim trazer a minha mulher para um exame e a Marisa e o Kalil armaram uma arapuca e me colocaram no tal de PET [aparelho que rastreia tumores]. Eu tinha passado pelo otorrino, o otorrino tinha visto a minha garganta inflamada.
Eu já estava há 40 dias com a garganta inflamada e cada pessoa que eu encontrava me dava uma pastilha No Brasil, as pessoas têm o hábito de dar pastilha para a gente. Não tinha uma pessoa que eu encontrasse que não me desse uma pastilha: 'Essa aqui é boa, maravilhosa, essa é melhor'. Eu já tava cansado de chupar pastilha.
No dia do meu aniversário, eu disse: 'Kalil, vou levar a Marisa para fazer uns exames'. E viemos para cá. O rapaz fez o exame, fez a endoscopia, disse que estava muito inflamada a minha garganta. Aí inventaram essa história de eu fazer o PET. Eu não queria fazer, eu não tinha nada, pô. Aí eu fui fazer depois de xingar muito o Kalil.
Depois, fui para uma sala onde estava o Kalil e mais uns dez médicos. Eu senti um clima meio estranho. O Kalil estava com uma cara meio de chorar. Aí eu falei: 'Sabe de uma coisa? Vocês já foram na casa de alguém para comunicar a morte? Eu já fui. Então falem o que aconteceu, digam!' Aí me contaram que eu tinha um tumor. E eu disse: 'Então vamos tratar'.
Existia a possibilidade de operar o tumor, em vez de fazer o tratamento que o senhor fez.
Na realidade, isso nem foi discutido. Eles chegaram à conclusão de que tinha que fazer o que tinha que fazer para destruir o bicho [quimioterapia seguida de radioterapia], que era o mais certo. Eu disse: 'Vamos fazer'.
O meu papel, então, a partir dessa decisão, era cumprir, era obedecer, me submeter a todos os caprichos que a medicina exigia. Porque eu sabia que era assim. Não pode vacilar. Você não pode [dizer]: 'Hoje eu não quero, não tô com vontade'.
O senhor rezava, buscou ajuda espiritual?
Eu rezo muito, eu rezo muito, independentemente de estar doente.
Fez alguma promessa?
Não.
Existia também uma informação de que o senhor procurou ajuda do médium João de Deus.
Eu não procurei porque não conhecia as pessoas, mas várias pessoas me procuraram e eu sou muito agradecido. Várias pessoas vieram aqui, ainda hoje há várias pessoas me procurando. E todas as que me procurarem eu vou atender, conversar, porque eu acho que isso ajuda.
E como será a vida do sr. a partir de agora? Vai seguir com suas palestras?
Eu não quero tomar nenhuma decisão maluca. Eu ainda estou com a garganta muito dolorida, não posso dizer que estou normal porque, para comer, ainda dói.
Mas acho que entramos na fase em que, daqui a alguns dias, eu vou acordar e vou poder comer pão, sem fazer sopinha. Vou poder comer pão com aquela casca dura. Vai ser o dia!
Eu vou tomando as decisões com o tempo. Uma coisa eu tenho a certeza: eu não farei a agenda que já fiz. Nunca mais eu irei fazer a agenda alucinante e maluca que eu fiz nesses dez meses desde que eu deixei o governo. O que eu trabalhei entre março e outubro de 2011... Nós visitamos 30 e poucos países.
Eu não tenho mais vontade para isso, eu não vou fazer isso. Vou fazer menos coisas, com mais qualidade, participar das eleições de forma mais seletiva, ajudar a minha companheira Dilma [Rousseff] de forma mais seletiva, naquilo que ela entender que eu possa ajudar. Vou voltar mais tranquilo. O mundo não acaba na semana que vem.
Quando é que o senhor começa a participar da campanha de Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo?
Eu acho o Fernando Haddad o melhor candidato. São Paulo não pode continuar na mesmice de tantas e tantas décadas. Eu acho que ele vai surpreender muita gente. E desse negócio de surpreender muita gente eu sei. Muita gente dizia que a Dilma era um poste, que eu estava louco, que eu não entendia de política. Com o Fernando Haddad será a mesma coisa.
O senhor vai pedir à senadora Marta Suplicy para entrar na campanha dele também?
Eu acho que a Marta é uma militante política, ela está na campanha.
Tem falado com ela?
Falei com ela faz uns 15 dias. Ela me ligou para saber da saúde. Eu disse que, quando eu sarar, a gente vai conversar um monte.
E em 2014? O senhor volta a disputar a Presidência?
Para mim não tem 2014, 2018, 2022. Deixa eu contar uma coisa para vocês: eu acabei de deixar a Presidência da República, tem apenas um ano e quatro meses que eu deixei a Presidência.
Poucos brasileiros tiveram a sorte de passar pela Presidência da forma exitosa com que eu passei. E repetir o que eu fiz não será tarefa fácil. Eu sempre terei como adversário eu mesmo. Para que é que eu vou procurar sarna para me coçar se eu posso ajudar outras pessoas, posso trabalhar para outras pessoas?
E depois é o seguinte: você precisa esperar o tempo passar. Essas coisas você não decide agora. Um belo dia você não quer uma coisa, de repente se apresenta uma chance, você participa.
Mas a minha vontade agora é ajudar a minha companheira a ser a melhor presidenta, a trabalhar a reeleição dela. Eu digo sempre o seguinte: a Dilma só não será candidata à reeleição se ela não quiser. É direito dela, constitucional, de ser candidata a presidente da República. E eu terei imenso prazer de ser cabo eleitoral.
segunda-feira, 12 de dezembro de 2011
Governo do Brasil financiou Pinochet no Chile
Não é novidade para quase ninguém que as ditaduras de direita implementadas nos países latino-americanos entre os anos de 1960 e 1980 estavam organizadas entre si, especialmente sob a supervisão da direita norte-americana, que governou os Estados Unidos da América na maior parte desse período de guerra fria. Exemplo dessa aliança foi a conhecida Operação Condor. Hoje, o jornal Folha de São Paulo e o portal Folha Transparência publicaram mais uma prova dessa organização continental. A notícia segue na íntegra logo abaixo.
Brasil financiou a ditadura de Pinochet
Em contrapartida, o Chile deu seu apoio a inúmeros candidatos brasileiros a cargos em órgãos internacionais
RUBENS VALENTE
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DE BRASÍLIA
O Brasil forneceu um amplo suporte econômico e diplomático aos primeiros anos da ditadura do general Augusto Pinochet no Chile.
É o que revela uma série de 266 telegramas confidenciais produzidos por diplomatas brasileiros entre 1973 e 1976.
Os telegramas sigilosos foram enviados e recebidos pela Embaixada do Brasil em Santiago do Chile e liberados pelo Itamaraty à Folha, que os divulga no site do projeto "Folha Transparência".
Os documentos indicam que a ajuda brasileira veio logo após o golpe liderado por Pinochet (1915-2006) em 11 de setembro de 1973.
Em novembro daquele ano, o Brasil, também governado por um ditador, Emílio Médici (1905-1985), liberou US$ 50 milhões ao Banco Central chileno para estimular exportações.
O socorro veio a pedido do Chile, que disse, por meio da chancelaria, se encontrar em "grave situação".
O Brasil abriu linhas de financiamento na Cacex, a Carteira de Crédito para Exportação do Banco do Brasil, para empresários interessados em vender para o Chile, estimulou a venda de açúcar, ônibus, caminhões e fragatas e acelerou a aquisição de cobre das jazidas chilenas.
De tal forma que passou, em 1976, ao posto de maior comprador externo de cobre, desbancando a Alemanha.
"É momento de concentrarmos aqui nossas compras de cobre. Isso nos dará aqui uma influência e uma expressão desvinculadas de quem governe o país", orientou o embaixador brasileiro.
No campo diplomático, o Brasil, a pedido da Junta Militar chilena, ocupou o status oficial de "protetor dos interesses do Chile" no México, na Polônia e na Iugoslávia.
Como esses países condenaram o golpe chileno, o Brasil assumiu a tarefa de representar o regime de Pinochet desde negociar a chegada de presos políticos a quitar compromissos do serviço diplomático.
TROCA DE FAVORES
Os telegramas também revelam o socorro que o Brasil deu ao Chile durante discussões na Organização dos Estados Americanos a propósito da situação dos direitos humanos no Chile -relatório de agosto contou 3.225 mortos ou desaparecidos políticos.
Nos foros internacionais, a diplomacia brasileira se absteve ou votou com o Chile em resoluções que pudessem constranger Pinochet.
"O projeto inicial bastante forte de moção condenatória do governo chileno foi 'aguado' por iniciativa das delegações brasileira e argentina", diz um telegrama de 1975 sobre sessão no Parlamento Latino-Americano.
Em contrapartida, Chile apoiou inúmeros candidatos brasileiros a cargos em organismos internacionais.
Os telegramas descrevem ainda como o Brasil operou para financiar aquisição, pelo Chile, de um sistema completo de comunicações para a Interpol do Chile, cujo objetivo é capturar foragidos da Justiça de outros países.
Documentos liberados pelos EUA dizem que uma das principais ajudas do Brasil à Operação Condor, um plano dos países latino-americanos para eliminar opositores políticos, foi montar uma rede de telecomunicações.
quinta-feira, 8 de dezembro de 2011
Regulamentação da EC 29 é aprovada
Ontem, o Senado Federal aprovou a lei que regulamenta a Emenda Constitucional n. 29, depois de 10 anos de negociações, conforme se lê na matéria seguinte, publicada no jornal Folha de São Paulo.
Essa regulamentação ganhou notoriedade em Xique-xique a partir da mobilização SOS Saúde, promovida pela sociedade civil, mas que foi apropriada e dominada por grupos político-partidários.
A partir da sanção da Lei pela presidente Dilma, o que ocorrerá em breve, mais dinheiro será investido na área de saúde pública, uma vez que algumas despesas que antes eram entendidas como matéria dessa área perderam esse qualitativo e agora não poderão mais ser incluídas nesse cálculo da saúde.
Atendida a reclamação do movimento SOS Saúde Xique-xique, O Xiquexiquense espera que agora se passe a combater os outros males que tanto prejudica a saúde pública dos hospitais da nossa cidade: a má gestão e a falta de fiscalização do tanto de dinheiro público que é destinado para essas instituições.
Senado sepulta criação de novo imposto para a saúde
Com aval do Planalto, governistas derrubam brecha que permitia novo tributo
Texto aprovado segue agora para sanção de Dilma; governo rejeita regra que o obrigava a gastar 10% com o setor
MÁRCIO FALCÃO
DE BRASÍLIA
O Senado aprovou ontem projeto de lei que regulamenta os gastos obrigatórios do governo federal, dos Estados e dos municípios com o sistema público de saúde.
Na votação, os senadores retiraram a previsão para a criação de um novo imposto para financiar o setor.
O Planalto ainda mobilizou a base para garantir a manutenção do texto aprovado em setembro pelos deputados, que já haviam rejeitado a criação de uma regra obrigando a União a investir 10% de sua receita na saúde.
A regulamentação da chamada "emenda 29" estava em discussão há mais de dez anos no Congresso e segue agora para sanção da presidente Dilma Rousseff, que ratificar a decisão.
Por 65 votos contra 4, os senadores retiraram do texto a brecha para que no futuro pudesse ser criado o novo imposto, a CSS (Contribuição Social à Saúde).
A Câmara já tinha deixado a CSS sem a base de cálculo, na prática inviabilizando a cobrança do novo tributo.
Mas o texto como fora aprovado pelos deputados ainda permitiria que um projeto de lei complementar apresentado ao Congresso pudesse instituir a base de cálculo para o imposto.
Agora, com a mudança, a criação de um novo tributo teria que começar do zero.
INVESTIMENTO
Pelo texto aprovado ontem, permanece para a União a regra segundo a qual o governo deve aplicar na saúde o valor empenhado (reservado para gasto) no orçamento anterior, acrescido da variação nominal do PIB (Produto Interno Bruto).
Atualmente, o Executivo destina 7% do PIB.
Caso a vinculação dos 10% fosse aprovada, isso significaria acréscimo de R$ 35 bilhões no orçamento da Saúde, que hoje é de R$ 71,5 bi.
A proposta terá maior impacto nos cofres dos Estados. O percentual obrigatório que eles devem investir (12% da receita) não muda. Mas a partir de agora eles não poderão contabilizar como gastos de saúde despesas como o pagamento de aposentadorias e restaurantes populares para alcançar esse percentual.
A nova lei define quais ações podem ser contabilizadas como gastos em saúde e prevê punição para quem descumprir as novas regras.
Senadores que atuam no setor avaliam que para cumprir as novas regras os governadores e prefeitos vão desembolsar R$ 3 bilhões/ano.
A principal mudança no texto é a que permite que os repasses do Fundeb (Fundo para Desenvolvimento da Educação) continuem na base de cálculo dos percentuais que os governadores precisam aplicar -o que representa hoje cerca de R$ 7 bi.
Houve ainda uma promessa do governo para incluir no Orçamento de 2012 R$ 3,4 bilhões em novas emendas parlamentares para reforçar o caixa da saúde.
Com ameaças de traições no PT e no PMDB, líderes governistas passaram o dia em negociações. Com o PR, teria sido discutida a composição de diretorias do Dnit. Segundo parlamentares, também ficou acertada liberação de emendas.
Essa regulamentação ganhou notoriedade em Xique-xique a partir da mobilização SOS Saúde, promovida pela sociedade civil, mas que foi apropriada e dominada por grupos político-partidários.
A partir da sanção da Lei pela presidente Dilma, o que ocorrerá em breve, mais dinheiro será investido na área de saúde pública, uma vez que algumas despesas que antes eram entendidas como matéria dessa área perderam esse qualitativo e agora não poderão mais ser incluídas nesse cálculo da saúde.
Atendida a reclamação do movimento SOS Saúde Xique-xique, O Xiquexiquense espera que agora se passe a combater os outros males que tanto prejudica a saúde pública dos hospitais da nossa cidade: a má gestão e a falta de fiscalização do tanto de dinheiro público que é destinado para essas instituições.
Senado sepulta criação de novo imposto para a saúde
Com aval do Planalto, governistas derrubam brecha que permitia novo tributo
Texto aprovado segue agora para sanção de Dilma; governo rejeita regra que o obrigava a gastar 10% com o setor
MÁRCIO FALCÃO
DE BRASÍLIA
O Senado aprovou ontem projeto de lei que regulamenta os gastos obrigatórios do governo federal, dos Estados e dos municípios com o sistema público de saúde.
Na votação, os senadores retiraram a previsão para a criação de um novo imposto para financiar o setor.
O Planalto ainda mobilizou a base para garantir a manutenção do texto aprovado em setembro pelos deputados, que já haviam rejeitado a criação de uma regra obrigando a União a investir 10% de sua receita na saúde.
A regulamentação da chamada "emenda 29" estava em discussão há mais de dez anos no Congresso e segue agora para sanção da presidente Dilma Rousseff, que ratificar a decisão.
Por 65 votos contra 4, os senadores retiraram do texto a brecha para que no futuro pudesse ser criado o novo imposto, a CSS (Contribuição Social à Saúde).
A Câmara já tinha deixado a CSS sem a base de cálculo, na prática inviabilizando a cobrança do novo tributo.
Mas o texto como fora aprovado pelos deputados ainda permitiria que um projeto de lei complementar apresentado ao Congresso pudesse instituir a base de cálculo para o imposto.
Agora, com a mudança, a criação de um novo tributo teria que começar do zero.
INVESTIMENTO
Pelo texto aprovado ontem, permanece para a União a regra segundo a qual o governo deve aplicar na saúde o valor empenhado (reservado para gasto) no orçamento anterior, acrescido da variação nominal do PIB (Produto Interno Bruto).
Atualmente, o Executivo destina 7% do PIB.
Caso a vinculação dos 10% fosse aprovada, isso significaria acréscimo de R$ 35 bilhões no orçamento da Saúde, que hoje é de R$ 71,5 bi.
A proposta terá maior impacto nos cofres dos Estados. O percentual obrigatório que eles devem investir (12% da receita) não muda. Mas a partir de agora eles não poderão contabilizar como gastos de saúde despesas como o pagamento de aposentadorias e restaurantes populares para alcançar esse percentual.
A nova lei define quais ações podem ser contabilizadas como gastos em saúde e prevê punição para quem descumprir as novas regras.
Senadores que atuam no setor avaliam que para cumprir as novas regras os governadores e prefeitos vão desembolsar R$ 3 bilhões/ano.
A principal mudança no texto é a que permite que os repasses do Fundeb (Fundo para Desenvolvimento da Educação) continuem na base de cálculo dos percentuais que os governadores precisam aplicar -o que representa hoje cerca de R$ 7 bi.
Houve ainda uma promessa do governo para incluir no Orçamento de 2012 R$ 3,4 bilhões em novas emendas parlamentares para reforçar o caixa da saúde.
Com ameaças de traições no PT e no PMDB, líderes governistas passaram o dia em negociações. Com o PR, teria sido discutida a composição de diretorias do Dnit. Segundo parlamentares, também ficou acertada liberação de emendas.
sexta-feira, 16 de setembro de 2011
O governo paulista e concurso público
Curto-circuito
É condenável, sob mais de um aspecto, o estratagema do governo estadual paulista de utilizar-se da Companhia Energética de São Paulo (Cesp) para contratar funcionários e, assim, burlar a exigência de concurso público.
Parte da mão de obra foi direcionada para a Secretaria Estadual de Energia, recém-criada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB). Ao todo, há mais de cem funcionários da companhia energética (do total de 1.260 empregados) distribuídos por dez instituições, entre secretarias, agência reguladora e Assembleia Legislativa.
A realização de concurso público é uma garantia de que a contratação se dará com base no princípio da impessoalidade e na capacidade técnica, e não por meio de indicações e inclinações políticas.
Desde sempre, um dos principais focos de corrupção e ineficiência da máquina administrativa são nomeações políticas para cargos públicos. Somente o governo federal oferece mais de 20 mil postos de livre nomeação, utilizados para manter a escorregadia fidelidade da base aliada, o que redunda em práticas de captura do interesse e dos recursos públicos que os escândalos recentes têm demonstrado à exaustão.
No caso paulista, as contratações por meio da Cesp -empresa privatizada nos anos 90, mas na qual o governo estadual ainda detém uma fatia de cerca de 40%- conotam um flerte injustificável com essas mesmas práticas.
Em menor escala, o atalho de usar uma empresa para empregar funcionários no serviço público remete ao escândalo do Baneser, revelado em 1991. A subsidiária do Banespa foi utilizada para contratar milhares de pessoas sem concurso, muitas das quais eram fantasmas ou trabalhavam só como cabos eleitorais.
Vinte anos depois, seria de esperar que o governo de São Paulo não recorresse a práticas semelhantes, que levantam questionamentos sobre a falta de transparência na gestão pública.
A Cesp e seus acionistas privados também parecem sair prejudicados. Não existe comprovação sólida de compensação pelos salários dos funcionários cedidos, pagos pela companhia energética.
O governo paulista argumenta que a empresa é ressarcida e que só recorreu ao expediente em razão da necessidade de garantir o funcionamento da nova secretaria, que não estava prevista no Orçamento deste ano.
Precisa, no entanto, devolver já os funcionários à Cesp e fazer contratações por concurso, restabelecendo assim a boa prática na administração pública.
Editorial do Jornal Folha de São Paulo de hoje.
É condenável, sob mais de um aspecto, o estratagema do governo estadual paulista de utilizar-se da Companhia Energética de São Paulo (Cesp) para contratar funcionários e, assim, burlar a exigência de concurso público.
Parte da mão de obra foi direcionada para a Secretaria Estadual de Energia, recém-criada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB). Ao todo, há mais de cem funcionários da companhia energética (do total de 1.260 empregados) distribuídos por dez instituições, entre secretarias, agência reguladora e Assembleia Legislativa.
A realização de concurso público é uma garantia de que a contratação se dará com base no princípio da impessoalidade e na capacidade técnica, e não por meio de indicações e inclinações políticas.
Desde sempre, um dos principais focos de corrupção e ineficiência da máquina administrativa são nomeações políticas para cargos públicos. Somente o governo federal oferece mais de 20 mil postos de livre nomeação, utilizados para manter a escorregadia fidelidade da base aliada, o que redunda em práticas de captura do interesse e dos recursos públicos que os escândalos recentes têm demonstrado à exaustão.
No caso paulista, as contratações por meio da Cesp -empresa privatizada nos anos 90, mas na qual o governo estadual ainda detém uma fatia de cerca de 40%- conotam um flerte injustificável com essas mesmas práticas.
Em menor escala, o atalho de usar uma empresa para empregar funcionários no serviço público remete ao escândalo do Baneser, revelado em 1991. A subsidiária do Banespa foi utilizada para contratar milhares de pessoas sem concurso, muitas das quais eram fantasmas ou trabalhavam só como cabos eleitorais.
Vinte anos depois, seria de esperar que o governo de São Paulo não recorresse a práticas semelhantes, que levantam questionamentos sobre a falta de transparência na gestão pública.
A Cesp e seus acionistas privados também parecem sair prejudicados. Não existe comprovação sólida de compensação pelos salários dos funcionários cedidos, pagos pela companhia energética.
O governo paulista argumenta que a empresa é ressarcida e que só recorreu ao expediente em razão da necessidade de garantir o funcionamento da nova secretaria, que não estava prevista no Orçamento deste ano.
Precisa, no entanto, devolver já os funcionários à Cesp e fazer contratações por concurso, restabelecendo assim a boa prática na administração pública.
Editorial do Jornal Folha de São Paulo de hoje.
terça-feira, 7 de junho de 2011
Bastidores: Painel.
Por ter acesso ao jornal de grande circulação, O Xiquexiquense repassará para a nossa blogosfera uma seção muito interessante sobre os bastidores da política nacional. Trata-se do Painel, editado por Renata Lo Petre, da Folha de São Paulo. Boa leitura.
Painel
Vale tudo
Para derrubar, hoje, a ida de Antonio Palocci à Comissão de Agricultura, governistas identificaram no regimento da Câmara um item segundo o qual a documentação da sessão tem de ser distribuída com ao menos 24 horas de antecedência -prazo que não teria sido respeitado quando da convocação do ministro.
Descobriu-se até um precedente. Em 2009, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), agora autor do pedido para obrigar Palocci a depor, fez um questionamento formal ao então presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), e obteve como resposta a anuência quanto à necessidade das 24 horas. O deputado ainda perguntou se isso valia para convocações. E Temer: "É evidente".
DDD Embora tenha conversado com Lula ao telefone sobre o caso Palocci, Dilma Rousseff pediu ao ex-presidente que não viesse a Brasília nesta semana. Quer evitar a interpretação de que o antecessor decidirá o futuro do ministro da Casa Civil.
Podendo Apesar da precaução, os envolvidos acreditam que Lula terá duplo poder de veto: em relação ao nome do substituto e à própria saída de Palocci.
Pra quê? Peemedebistas reagem com gargalhadas à especulação de que o partido poderia a herdar a Secretaria de Relações Institucionais, hoje ocupada pelo petista Luiz Sérgio. "Para resolver o problema de articulação política é preciso ter trânsito no governo. E nós não temos", resume um cardeal.
Lipo 1 Ao receber, há cerca de um mês, a relação de pessoas que seriam agraciadas com a medalha da Ordem de Rio Branco, a principal da diplomacia brasileira, Dilma não teve dúvida: cortou a lista quase à metade.
Lipo 2 Quem viu a relação original notou que foram limados vários políticos e integrantes do governo federal, primeiro escalão incluído. A presidente teria comentado que não era, ainda, o momento de homenageá-los.
Lipo 3 Comentário de um aliado sobre a atenção dada pela presidente aos mínimos detalhes, enquanto assuntos importantes seguem represados na gaveta: "Quando ministro não pode demitir nem a secretária sem aval da presidente, as coisas não andam. Esse grau de centralismo nunca deu certo".
Entulho 1 Para evitar a descontinuidade nas obras de desassoreamento do Tietê, o governo de Geraldo Alckmin (PSDB) planeja ceder à iniciativa privada os serviços de limpeza da calha do rio e manutenção dos piscinões na Grande SP. O modelo previsto é uma PPP com duração de até 30 anos.
Entulho 2 Na visão dos técnicos do governo, a terceirização daria regularidade ao combate às enchentes. Neste ano, o TCE-SP paralisou licitações por duas vezes consecutivas sob alegação de falhas nos pregões, o que atrasou em um mês o início da retirada de material para dar mais vazão às águas.
Maria-fumaça O Ministério Público Federal entrará nesta semana com representação no TCU para que o tribunal tome providências sobre o que os procuradores classificam como "dilapidação do patrimônio da extinta Rede Ferroviária Federal". Eles afirmam haver abandono de mais de 50% da malha privatizada e falta de fiscalização pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres ), com prejuízo estimado em R$ 40 bilhões.
Linha cruzada 1 Grampos telefônicos feitos durante as investigações em Campinas mostram assessoras de Aline Corrêa (PP-SP) tratando da nomeação, para o gabinete da deputada, de Ricardo Candia, ex-funcionário da prefeitura preso sob acusação de integrar o esquema de corrupção.
Linha cruzada 2 Segundo a assessoria de Aline, Candia havia pedido "uma colocação", mas sua contratação "não foi aprovada".
com LETÍCIA SANDER e RANIER BRAGON
tiroteio
"As dúvidas ficarão mais esclarecidas se o ministro completar as entrevistas que deu com uma vinda ao Congresso Nacional."
DO SENADOR EDUARDO SUPLICY (PT-SP), defendendo que Antonio Palocci vá espontaneamente explicar sua evolução patrimonial a deputados e senadores.
contraponto
Máquina zero
Em almoço de Dilma com representantes do PMDB, o senador Waldemir Moka (MS) fez defesa enfática do novo Código Florestal tal como aprovado na Câmara. E acrescentou:
-Quero dizer que não sou produtor rural. Sou médico e professor!
Na saída, um colega brincou:
-Imagine se ele fosse ruralista. Cortaria o cabelo do Requião pensando que era floresta!
sexta-feira, 3 de junho de 2011
Bastidores: Painel.
Por ter acesso ao jornal de grande circulação, O Xiquexiquense repassará para a nossa blogosfera uma seção muito interessante sobre os bastidores da política nacional. Trata-se do Painel, editado por Renata Lo Petre, da Folha de São Paulo. Boa leitura.
Painel
RENATA LO PRETE - painel@uol.com.br
A era da incerteza
Entre petistas e principalmente aliados, dissemina-se a impressão de que a eventual saída de Antonio Palocci não será suficiente para pacificar a situação no Congresso, onde o governo, a despeito de sua folgada maioria teórica, segue tomando sustos.Embora reconheçam que a situação do ministro da Casa Civil é crítica, deputados e senadores alegam que só haverá luz no fim do túnel se for abandonada a política de autossuficiência e confronto -da qual, lembram, Palocci era apenas o executor, obedecendo às ordens da presidente. "A crise é de gênero. O nome da crise não é Palocci", diz um expoente do PMDB.
Wally Senadores estranharam a ausência do líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), durante a confusa sessão que terminou somente na madrugada de ontem e na qual a oposição conseguiu derrubar a votação de duas MPs. Segundo relatos, ele estava no gabinete assistindo à classificação do Santos para a final da Libertadores.
Para avaliar Das três MPs, só uma foi aprovada -a de interesse do principal ministro indicado pelo PMDB do Senado, Edison Lobão (Minas e Energia). Entre vários outros itens, a medida renova por mais 25 anos encargo da conta de luz.
Vírus do silêncio Em audiência pública na Câmara, Chico Alencar (PSOL-RJ) se desculpou por sua rouquidão: "Peguei a gripe Palocci, aquela que tira a voz".
Conveniências Ontem, a Executiva do PT deixou para discutir o caso Palocci na iminência do encerramento da reunião. E se valeu da escanteada ala mais à esquerda do partido para sepultar a divulgação de uma nota pró-ministro. Integrantes desse grupo, como Renato Simões, pediram a saída de Palocci.
Gesto Criticada pela classe política, Dilma fez questão, ontem, de citar nominalmente grande parte dos presentes ao lançamento do Brasil Sem Miséria.
Reservado No jantar de anteontem no Alvorada, Dilma e Ellen Gracie, que em breve pedirá aposentadoria do STF, travaram bate-papo a sós por um bom tempo.
Pasta rosa 1 Em depoimento que integra a investigação do escândalo de corrupção em Campinas, Marcelo Wegner Teixeira, segurança de um dos acusados de participação no esquema, diz que nas eleições de 2008 foram distribuídos dossiês a adversários do prefeito Dr. Hélio (PDT). Os papéis, com relatos da situação agora revelada, teriam sido enviados a Carlos Sampaio (PSDB) e Jonas Donizette (PSB).
Pasta rosa 2 Os dois negam ter recebido a encomenda. "Nunca vi isso. E, se tivesse tomado conhecimento, teria encaminhado imediatamente ao Ministério Público", diz Sampaio.
Subterrâneos Em um dos diálogos flagrados nas escutas telefônicas, o coordenador de Comunicação da prefeitura, Francisco de Lagos, diz para a primeira-dama, Rosely Nassim -acusada de ser a coordenadora do esquema-, que recebeu a notícia dos bastidores da polícia de que havia "alguma coisa escondida no poço" da chácara dela.
Calculadora O governo paulista sustenta que a repactuação das taxas de retorno das concessionárias de rodovias não resultará, necessariamente, em redução nos preços dos pedágios. Apesar das dificuldades operacionais detectadas para a implantação da medida, a cobrança por km rodado é uma alternativa em estudo para as estradas sob concessão.
com LETÍCIA SANDER e RANIER BRAGON
tiroteio
"Dilma bem que poderia escalar o Palocci como consultor do programa Brasil sem Miséria. Seria certeza de sucesso."
DO PRESIDENTE DO PSDB, SÉRGIO GUERRA, comentando o lançamento das iniciativas do governo para combater a pobreza extrema em meio à crise provocada pela revelação do rápido enriquecimento do ministro da Casa Civil.
contraponto
Garfo e faca
Em almoço anteontem com Dilma Rousseff, os caciques do PMDB evitaram falar de cargos e de verbas federais, dois assuntos relacionados à imagem fisiológica da qual o partido procura se dissociar.
Na fila do bufê, o senador Renan Calheiros reparou na frugalidade do prato de José Sarney:
-O senhor veio até aqui para comer só isso?
Sarney pensou um pouco, e Renan emendou, rindo:
-Se eu fosse o senhor, colocava mais. Ninguém vai acreditar que o senhor saiu daqui com tão pouco...
segunda-feira, 30 de maio de 2011
Bastidores: Painel.
Por ter acesso ao jornal de grande circulação, O Xiquexiquense repassará para a nossa blogosfera uma seção muito interessante sobre os bastidores da política nacional. Trata-se do Painel, editado por Renata Lo Petre, da Folha de São Paulo. Boa leitura.
Painel
Vício de origem
A despeito de uma agenda de encontros e oportunidades de foto, a ser executada ao longo desta semana com o objetivo de desanuviar o ambiente e demonstrar entendimento entre a presidente e seu vice, os mais próximos manifestam, em privado, sérias dúvidas quanto à possibilidade de melhorar substancialmente a relação Dilma Rousseff-Michel Temer.O motivo seria a arraigada desconfiança da presidente, que enxerga o vice como parte de um trio de peemedebistas -completado pelos deputados Henrique Alves e Eduardo Cunha - decidido a conspirar contra ela. A votação do Código Florestal foi mais um episódio ao qual Dilma aplicou essa interpretação.
Telefonia Na operação quebra-gelo iniciada no sábado, primeiro Temer ligou para Dilma. Ele estava na espera quando a ligação caiu. Ela então ligou de volta.
Risco gaveta A oposição teme que a proximidade da sucessão na Procuradoria-Geral da República e o pleito de Roberto Gurgel por um novo mandato, a ser decidido pela caneta da presidente da República, joguem contra o empenho elucidativo da multiplicação patrimonial de Antonio Palocci.
Porta-voz Com Palocci no banco, cresce a visibilidade do secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho.
Plutônio 1 A lista de políticos apreensivos com o escândalo de corrupção em Campinas é longa e vai além das fronteiras do PT. Velho amigo de Lula, o prefeito Dr. Hélio (PDT) tem conexões nas mais variadas siglas. Recentemente, foi convidado a ingressar no PSD de Gilberto Kassab. Declinou da oferta.
Plutônio 2 Nos preparativos para a sucessão paulista de 2010, uma ala do PT lançou na praça a ideia de patrocinar a candidatura de Dr. Hélio ao governo. Indagado a respeito, um cardeal do partido foi direto: "Ele não aguenta uma semana de exposição no noticiário".
Gritaria Em reunião na semana passada, a bancada do PMDB se derramou em críticas ao relatório do colega Ricardo Ferraço (ES) sobre o projeto de reforma administrativa do Senado. Foi especialmente combatida a ideia de reduzir o número de funcionários concursados nos gabinetes. Presente, José Sarney (AP) pouco falou.
A luta continua Por mais alinhada com Aécio Neves que seja a nova direção do PSDB, José Serra saiu da convenção de anteontem tão disposto quanto antes a voltar a disputar a Presidência em 2014. Nas palavras de quem os conhece bem, ambos seguem determinados e "com o mesmo sentimento de eliminar o outro".
Nem te conto Anfitrião da extenuante reunião em Brasília na qual foi definida a cúpula tucana, o deputado Duarte Nogueira (PSDB-SP) brincou que irá ceder o imóvel para refilmagem de "Se Meu Apartamento Falasse".
Eu? Imagine... Depois de passar as últimas semanas apertando todos os botões possíveis na tentativa de assegurar a presidência do Instituto Teotônio Vilela, que no final lhe foi negada pelos aecistas, Serra reagiu mal quando abordado por repórteres na saída da convenção tucana: "É ridículo imaginar que eu disputaria o ITV".
Parou por quê? O governo de SP congelou a liberação de novas linhas de ônibus intermunicipais até que todos os lotes sejam submetidos a processo licitatório, conforme exige a lei desde dezembro passado. O pedido para regularizar o sistema foi enviado ao PED (Programa Estadual de Desestatização). Antes, haverá uma rodada de audiências públicas.
com LETÍCIA SANDER e FABIO ZAMBELI
tiroteio"A convenção do PSDB não foi uma disputa entre paulistas e mineiros, como querem alguns. Foi apenas um momento para mostrar que a fila andou."
DO SECRETÁRIO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE MINAS, NÁRCIO RODRIGUES, expoente da tropa de choque de Aécio Neves, comentando o evento no Twitter.
Contraponto
Regime Disciplinar Diferenciado
No sábado, quando já estavam reunidos havia três horas na tentativa de costurar um acordo para a composição do comando do PSDB, o mineiro Antonio Anastasia desabafou com o colega Geraldo Alckmin:
-Acho que é mais fácil administrar os nossos Estados do que chegar a um entendimento aqui...O governador paulista, que já havia encarado outra rodada de negociação madrugada adentro, foi além:
-Acho que é mais fácil debelar uma rebelião num presídio de segurança máxima!
quinta-feira, 26 de maio de 2011
Repercussão negativa do Código florestal.
A leitura atenta dos principais jornais do país leva à conclusão de que também a imprensa vê com más olhos a aprovação do Código florestal pela Câmara dos deputados. Classificam as novas regras como um retrocesso para o setor, especialmente porque elas autorizam com mais força o desmatamento sem nenhuma medida compensatória para o meio ambiente.
Pelo contrário, a anistia que o novo Código prevê passa uma sensação de impunidade para a sociedade e despreaza a pouca fiscalização que ainda persiste no Brasil. Qual estimulo que se está dando para os servidores do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) e do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade)? Nenhum. Mas depois, quando os índices de poluição, queimada e desmatamento crescerem e chamarem atenção dos órgãos internacionais, haverá muitos para culpar a falta de fiscalização do Estado.
Nessas horas decisivas para o futuro do país, é necessário que não sejamos míopes para pensar só nos interesses mesquinhos e individualistas do presente. Se em nossa Xique-xique de hoje já está difícil pescar o peixe e percorrer o rio sem que o barco enqualhe, imagine como não ficará em pouco tempo quando se tornará possível desmatar a partir de 15m da margem do rio? E quem mora nas grandes cidades? Deslizamentos, aquecimento global, chuvas torrenciais sucedidas de verões escaldantes. Será que a vida no futuro continuará sendo viável? E nossos netos, nos perdoarão amanhã por termos permitido medidas de desmatamento e destruição da natureza como está em votação no Congresso nacional?
É preciso, portanto, ter preocupação e cuidado com o futuro e estar atento ao que ocorre em Brasília hoje, porque isso influenciará muito as nossas vidas, queiramos ou não. Seguem, enfim, e nessa ordem, os editoriais dos jornais Folha de São Paulo e Correio Braziliense publicados hoje.
O código do PMDB
Na confrontação em que se transformou o exame do novo Código Florestal pela Câmara dos Deputados, não foi a oposição que ganhou, nem só o governo saiu derrotado. Perdeu o país todo.
O texto básico de Aldo Rebelo (PC do B-SP), o mais próximo de um acordo entre Planalto e bancada ruralista a que se conseguiu chegar, terminou aprovado por 410 votos. Ainda que desequilibrado em favor dos produtores rurais, tinha o mérito de descriminalizar a ocupação antiga, pela agropecuária, de algumas áreas que a lei veio a considerar de preservação permanente, como encostas e topos de morro.
Concessões aos ruralistas já eram inevitáveis, nessa altura, e o governo federal chegou a negociar. O relatório afinal aprovado na Câmara, contudo, vai muito além do atendimento a pleitos justificáveis e compromissos pragmáticos. Como está, põe as florestas sob ameaça considerável.
Imóveis rurais com até quatro módulos fiscais (20 a 400 hectares, conforme a região) ficariam dispensados de recompor matas devastadas. No caso de derrubadas ao longo de rios de até 10 m de largura, o reflorestamento obrigatório ocorreria só numa faixa de 15 m, e não mais 30 m.
Também seriam extintas as multas e autuações de quem desmatou ilegalmente, se o produtor vier a reconhecer seu passivo ambiental e aceitar plano de recuperação definido por governos estaduais (notoriamente mais permissivos que o federal). Essa espécie de anistia valeria para quem desmatou até julho de 2008, em plena vigência do código modificado por medida provisória em 2001.
Cria-se, com isso, um sério precedente. Produtores podem sentir-se incentivados a prosseguir desmatando, diante da deficiência crônica da fiscalização e da expectativa de um novo perdão.
A assimetria pró-ruralista foi amplificada por uma emenda do PMDB, que teve 273 votos. O partido do vice-presidente da República, Michel Temer, apoiou em peso a emenda, tão unido quanto PSDB e DEM no voto contra o governo em que detém seis ministérios.
A inconfiabilidade peemedebista não augura boa perspectiva para o governo reequilibrar o novo código no Senado. Restará à presidente Dilma Rousseff vetar itens como a anistia, cumprindo o que prometeu na campanha eleitoral.
Retrocesso ambiental
A Câmara dos Deputados engatou marcha a ré na questão ambiental brasileira justo quando o país se prepara para sediar, entre 4 e 6 de junho do ano que vem, reunião mundial sobre meio ambiente, a Rio 20. Depois de 12 anos de debates, em vez de marco regulatório que seja modelo de preservação e ponha o Brasil na vanguarda do desenvolvimento sustentável, prevaleceu o interesse de desmatadores. Chocou, sobretudo, a consolidação de áreas desmatadas de forma ilegal, até 2008, por agricultores e pecuaristas.
Aprovado por folgada maioria de 410 a 63 votos, o novo Código Florestal também capenga ao deixar por conta dos estados a regularização das áreas de preservação permanente. Com as assembleias legislativas mais suscetíveis à pressão do poder econômico, é de se imaginar o desastre que se prenuncia, em especial nas unidades da Federação em que predomina a atividade agropecuária. Basta ver o incremento do desmate na Amazônia Legal nos meses que antecederam a votação na Câmara. Comparado com o ano passado, o aumento foi a quase 500% em março e abril.
A anistia aos desmatadores era a principal aspiração dos ruralistas. Contida na Emenda nº 164, passou fácil, no início da madrugada de ontem, com 273 votos favoráveis e 182 contrários. O resultado deixou claros a falta de liderança do governo e o descompromisso da base aliada com o Palácio do Planalto, pois contraria frontalmente as promessas de campanha da então candidata Dilma Rousseff. Agora a presidente classifica como “uma vergonha” a proposta aprovada, segundo afirmou o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). Outra polêmica é a dispensa de reserva legal em propriedades de até quatro módulos rurais de terra (de 20 a 400 hectares, a depender do bioma).
Consta que Dilma estaria disposta a vetar os pontos inaceitáveis da proposta aprovada caso sejam mantidos pelo Senado. Espera-se que a Casa Revisora faça o serviço de limpeza. Afinal, o PT de Dilma e o PMDB do vice-presidente da República, Michel Temer, formam ali as duas maiores bancadas, detendo, sozinhos, mais de um terço dos senadores. Com os aliados PSB, PDT, PTB, PR, PRB e PCdoB (este, do deputado Aldo Rebelo, relator do Código aprovado na Câmara), os governistas têm 56 das 81 cadeiras da Câmara Alta.
Ainda que seja ingenuidade imaginar o pleno atendimento a produtores e ambientalistas, é imperativo encontrar o equilíbrio que permita conciliar o agronegócio com a defesa do meio ambiente. O Brasil ganhou posição de destaque na última década do século passado, com a Eco-92, exatamente por conduzir a convenção das Nações Unidas que reuniu no Rio de Janeiro representantes de 179 países (em 1992) com a firme intenção de produzir leis que assegurem o desenvolvimento sustentável, harmonizando o crescimento econômico e social com a preservação ambiental. Esse é o único caminho seguro para o planeta Terra, já tão abalado pelos erros pretéritos.
quinta-feira, 19 de maio de 2011
Desmatamento acelera na espera de anistia.
Noticias publicadas ontem e hoje na imprensa dão conta de que o governo colocará em votação o projeto do novo Código florestal. Espera-se que seja apreciado na terça-feira que vem. Depois de tantas idas e vinda acompanhadas nas últimas semanas, a informação deve ser recebida com cautela pelo xiquexiquense. Mas, o que despertou a atenção deste blog foi a notícia de que houve um aceleramento no desmate da floresta amazônica, que cresceu estrondosos 473% de maio a abril deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado.
Segundo ambientalistas, esse aumento decorreu da expectativa dos desmatadores de serem anistiados pelo novo Código florestal. Observando a evolução da legislação ambiental, percebe-se que de tempo em tempo é aprovada lei que de fato anistia as altas multas impostas em período anterior pelo Ibama. Essa política como se vê termina por incentivar o desmatamento, indo de encontro com a finalidade das punições e desmotivando o trabalho do Ibama.
O índice de 473% de aumento do desmatamento em um mês é para O Xiquexiquense um sinal claro para os legisladores de que as regras de desmatamento devem ser ainda mais rigorosas, assim como a fiscalização do Ibama. Segue, enfim, a reportagem publicada no jornal Folha de SP de hoje sobre o tema.
Desmate tem nova alta de quase 30% na região amazônica
Dado vem do Deter, sistema que monitora por satélite a devastação e é relativamente impreciso, apesar de ágil Números são do período que vai de agosto passado a abril; elo com debates sobre nova lei de florestas é debatido
Dados divulgados pelo governo federal indicam um aumento de ao menos 27% no desmatamento acumulado na Amazônia entre agosto do ano passado e abril, em comparação com o mesmo período do ano passado.
O sistema de monitoramento por satélite Deter, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), conseguiu detectar também um crescimento anormal da derrubada da floresta nos últimos dois meses, quando a discussão sobre reformas no Código Florestal esquentou. Mesmo sendo o período de chuvas na região, momento em que o desmate é mais trabalhoso e costuma cair, a destruição cresceu 473% em março e abril deste ano em relação a esses meses de 2010.
O conjunto das informações é muito preocupante, diz o Ministério do Meio Ambiente, que criou até um gabinete de crise e colocou mais de 500 homens em ações fiscalizadoras na região para tentar conter a tendência.
O problema parece estar concentrado em Mato Grosso. O Estado teve no mínimo 480 km2 de área derrubada, boa parte disso em cidades que não costumam liderar o ranking do desmate, como Cláudia e Santa Carmem.
Os números podem ser ainda maiores. Primeiro porque o Deter é ágil, mas incapaz de registrar todo o desmate. Segundo porque o Pará, líder histórico da derrubada, tinha mais de 80% de seu território coberto por nuvens, o que impediu o satélite de observar o que ocorreu ali no período.
O tamanho mais exato das áreas desmatadas sairá no relatório do sistema Prodes, também do Inpe, considerado muito mais preciso.
PONTO DE VIRADA?
Os dados, que confirmam o que medira a ONG Imazon, podem significar uma inflexão na tendência de diminuição do desmatamento, observada desde 2006, que bateu recorde histórico em 2010.
Ontem, ao anunciar os resultados do Deter e enumerar o que o governo tem feito para tentar conter a "explosão" da derrubada em Mato Grosso, a ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) disse não ter elementos para ligar o aumento com a tentativa de reformar o Código Florestal.
Para pesquisadores e funcionários do próprio Ibama, órgão que tenta coibir e punir o desmate, a principal hipótese para o crescimento é a expectativa de que, mesmo desmatando ilegalmente, os produtores acabarão sendo anistiados pelo texto do relator Aldo Rebelo (PCdoB-SP).
Para Márcio Astrini, do Greenpeace, o aumento nos números "joga a discussão sobre o código da Câmara para o Itamaraty", pois coloca em risco os compromissos assumidos pelo Brasil perante a comunidade internacional em relação à Amazônia.
Mesmo a senadora Kátia Abreu, presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), admitiu à Folha que "meia dúzia" de produtores pode ter desmatado esperando serem anistiados pelo futuro novo Código Florestal.
"Mas isso é isolado. O Brasil desmata cada vez menos. Não vamos permitir que isso atrase ainda mais a votação", afirmou. Para ela, é possível que ONGs tenham pressionado o adiamento da votação do código para que os dados do Deter fossem divulgados.
terça-feira, 10 de maio de 2011
Bastidores: Painel.
Por ter acesso ao jornal de grande circulação, O Xiquexiquense repassará para a nossa blogosfera uma seção muito interessante sobre os bastidores da política nacional. Trata-se do Painel, editado por Renata Lo Petre, da Folha de São Paulo. Divirtam-se.
PainelRENATA LO PRETE
Paciência no limiteDilma Rousseff não esconde mais sua contrariedade com a Infraero, agora comandada por Gustavo Valle. Em recente reunião sobre aeroportos, a presidente, por mais de uma vez, foi ríspida com os diretores Jaime Parreira (Engenharia) e João Márcio Jordão (Operações). "Vocês estão me enrolando há oito anos", desabafou. Quando eles mencionaram que o Exército toca parte da obra do terceiro terminal de Cumbica, ela rebateu: "O Exército, que não trabalha três turnos? Que não trabalha nos fins de semana?".Em outra ocasião, Dilma teria dito ao próprio Valle: "Quando chamei o senhor para o cargo, sabia que não entendia de aeroportos. Mas se passaram semanas".Sem chance Em reunião posterior, sem a presença de Dilma, Antonio Palocci (Casa Civil) examinou o relato dos representantes da Infraero sobre o ritmo das obras nos aeroportos e disse: "Esse calendário a presidente não vai aprovar".
Refresco Embora Dilma vá receber hoje os prefeitos da marcha sem disposição de recuo no assunto "restos a pagar", indicará que recursos federais começarão a pingar nos próximos dias nos cofres das prefeituras.
Na mesma Sabendo de antemão que obteria resposta negativa, o relator do Código Florestal, Aldo Rebelo (PC do B-SP), propôs ao Planalto reconhecer em documento que não considera a produção de alimentos atividade de "interesse social". Isso depois que o governo aceitou desobrigar do reflorestamento áreas consolidadas com essa característica.
Atentai! O Planalto faz de tudo para congelar a articulação que visa levar a voto, amanhã, o veto de Lula sobre a divisão dos royalties do petróleo tal como aprovada pelo Congresso. A pressão pró-apreciação vem do PMDB.
Para poucos À diferença da maioria dos chefes de Estado, que costumam ser recebidos no Itamaraty, Hugo Chávez almoçará com Dilma hoje no Alvorada. A lista de convidados será enxuta.
Olha eu aqui Enquanto Ana de Hollanda (Cultura) balança, há quem veja movimentação de Antonio Grassi para herdar a pasta caso a ministra caia. As chances de sucesso do presidente da Funarte são remotas.
Apito Recém-eleito presidente do PSDB paulista, o alckmista Pedro Tobias resumiu no Twitter seu diagnóstico sobre o tucanato: "Não existe crise. Existe é muito cacique e pouco índio".
Fico De início escalado para atrair lideranças do interior ao PSD de Gilberto Kassab, o prefeito de Mogi das Cruzes, Marco Bertaiolli, decidiu permanecer no DEM. O partido diz que manterá 70 das 76 prefeituras que administra atualmente em SP.
Outro lado Paulo Renato Souza, ex-secretário paulista da Educação, afirma que deixou os conselhos de administração da Cesp e da Companhia Paulista de Obras e Serviços em abril.
Visitas à Folha Tarso Genro (PT), governador do Rio Grande do Sul, visitou ontem a Folha, a convite.Wagner Rossi (PMDB), ministro da Agricultura, visitou ontem a Folha, onde foi recebido em almoço.Valdir Raupp (RO), senador e presidente do PMDB, visitou ontem a Folha.Arystóbulo de Oliveira Freitas, presidente da AASP, visitou ontem a Folha. Estava acompanhado de Sérgio Rosenthal, vice, e Leonardo Sica, diretor-secretário.com LETÍCIA SANDER e FABIO ZAMBELI
tiroteio"O partido do Kassab acabou virando a janela que o Congresso não aprovou."DO DEPUTADO FEDERAL JOSÉ MENTOR (PT-SP), sobre o fato de o PSD ter se tornado o receptor natural de políticos que queriam trocar de legenda, mas temiam ter seus mandatos cassados pela Justiça Eleitoral; como se trata de uma nova agremiação, não há impedimento legal.
contrapontoMelhor idadeBenedita da Silva (PT-RJ) é assídua frequentadora das reuniões da bancada da juventude da Câmara. A sexagenária deputada, ex-senadora e ex-governadora, chegou ao grupo timidamente.
-Aqui pode entrar jovem de até quantos anos?
-Mas o que é isso? Juventude não está na idade, e sim no espírito- respondeu o presidente do grupo, Domingos Neto (PSB-CE), 22.
Dos 513 deputados federais que integram a atual legislatura, 41 têm menos de 35 anos.
Assinar:
Postagens (Atom)