quinta-feira, 26 de maio de 2011

Repercussão negativa do Código florestal.

A leitura atenta dos principais jornais do país leva à conclusão de que também a imprensa vê com más olhos a aprovação do Código florestal pela Câmara dos deputados. Classificam as novas regras como um retrocesso para o setor, especialmente porque elas autorizam com mais força o desmatamento sem nenhuma medida compensatória para o meio ambiente.

Pelo contrário, a anistia que o novo Código prevê passa uma sensação de impunidade para a sociedade e despreaza a pouca fiscalização que ainda persiste no Brasil. Qual estimulo que se está dando para os servidores do IBAMA  (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) e do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade)? Nenhum. Mas depois, quando os índices de poluição, queimada e desmatamento crescerem e chamarem atenção dos órgãos internacionais, haverá muitos para culpar a falta de fiscalização do Estado. 

Nessas horas decisivas para o futuro do país, é necessário que não sejamos míopes para pensar só nos interesses mesquinhos e individualistas do presente. Se em nossa Xique-xique de hoje já está difícil pescar o peixe e percorrer o rio sem que o barco enqualhe, imagine como não ficará em pouco tempo quando se tornará possível desmatar a partir de 15m da margem do rio? E quem mora nas grandes cidades? Deslizamentos, aquecimento global, chuvas torrenciais sucedidas de verões escaldantes. Será que a vida no futuro continuará sendo viável? E nossos netos, nos perdoarão amanhã por termos permitido medidas de desmatamento e destruição da natureza como está em votação no Congresso nacional?

É preciso, portanto, ter preocupação e cuidado com o futuro e estar atento ao que ocorre em Brasília hoje, porque isso influenciará muito as nossas vidas, queiramos ou não. Seguem, enfim, e nessa ordem, os editoriais dos jornais Folha de São Paulo e Correio Braziliense publicados hoje.

O código do PMDB
Na confrontação em que se transformou o exame do novo Código Florestal pela Câmara dos Deputados, não foi a oposição que ganhou, nem só o governo saiu derrotado. Perdeu o país todo.
O texto básico de Aldo Rebelo (PC do B-SP), o mais próximo de um acordo entre Planalto e bancada ruralista a que se conseguiu chegar, terminou aprovado por 410 votos. Ainda que desequilibrado em favor dos produtores rurais, tinha o mérito de descriminalizar a ocupação antiga, pela agropecuária, de algumas áreas que a lei veio a considerar de preservação permanente, como encostas e topos de morro.
Concessões aos ruralistas já eram inevitáveis, nessa altura, e o governo federal chegou a negociar. O relatório afinal aprovado na Câmara, contudo, vai muito além do atendimento a pleitos justificáveis e compromissos pragmáticos. Como está, põe as florestas sob ameaça considerável.
Imóveis rurais com até quatro módulos fiscais (20 a 400 hectares, conforme a região) ficariam dispensados de recompor matas devastadas. No caso de derrubadas ao longo de rios de até 10 m de largura, o reflorestamento obrigatório ocorreria só numa faixa de 15 m, e não mais 30 m.
Também seriam extintas as multas e autuações de quem desmatou ilegalmente, se o produtor vier a reconhecer seu passivo ambiental e aceitar plano de recuperação definido por governos estaduais (notoriamente mais permissivos que o federal). Essa espécie de anistia valeria para quem desmatou até julho de 2008, em plena vigência do código modificado por medida provisória em 2001.
Cria-se, com isso, um sério precedente. Produtores podem sentir-se incentivados a prosseguir desmatando, diante da deficiência crônica da fiscalização e da expectativa de um novo perdão.
A assimetria pró-ruralista foi amplificada por uma emenda do PMDB, que teve 273 votos. O partido do vice-presidente da República, Michel Temer, apoiou em peso a emenda, tão unido quanto PSDB e DEM no voto contra o governo em que detém seis ministérios.
A inconfiabilidade peemedebista não augura boa perspectiva para o governo reequilibrar o novo código no Senado. Restará à presidente Dilma Rousseff vetar itens como a anistia, cumprindo o que prometeu na campanha eleitoral.

Retrocesso ambiental
A Câmara dos Deputados engatou marcha a ré na questão ambiental brasileira justo quando o país se prepara para sediar, entre 4 e 6 de junho do ano que vem, reunião mundial sobre meio ambiente, a Rio 20. Depois de 12 anos de debates, em vez de marco regulatório que seja modelo de preservação e ponha o Brasil na vanguarda do desenvolvimento sustentável, prevaleceu o interesse de desmatadores. Chocou, sobretudo, a consolidação de áreas desmatadas de forma ilegal, até 2008, por agricultores e pecuaristas.
Aprovado por folgada maioria de 410 a 63 votos, o novo Código Florestal também capenga ao deixar por conta dos estados a regularização das áreas de preservação permanente. Com as assembleias legislativas mais suscetíveis à pressão do poder econômico, é de se imaginar o desastre que se prenuncia, em especial nas unidades da Federação em que predomina a atividade agropecuária. Basta ver o incremento do desmate na Amazônia Legal nos meses que antecederam a votação na Câmara. Comparado com o ano passado, o aumento foi a quase 500% em março e abril.
A anistia aos desmatadores era a principal aspiração dos ruralistas. Contida na Emenda nº 164, passou fácil, no início da madrugada de ontem, com 273 votos favoráveis e 182 contrários. O resultado deixou claros a falta de liderança do governo e o descompromisso da base aliada com o Palácio do Planalto, pois contraria frontalmente as promessas de campanha da então candidata Dilma Rousseff. Agora a presidente classifica como “uma vergonha” a proposta aprovada, segundo afirmou o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). Outra polêmica é a dispensa de reserva legal em propriedades de até quatro módulos rurais de terra (de 20 a 400 hectares, a depender do bioma).
Consta que Dilma estaria disposta a vetar os pontos inaceitáveis da proposta aprovada caso sejam mantidos pelo Senado. Espera-se que a Casa Revisora faça o serviço de limpeza. Afinal, o PT de Dilma e o PMDB do vice-presidente da República, Michel Temer, formam ali as duas maiores bancadas, detendo, sozinhos, mais de um terço dos senadores. Com os aliados PSB, PDT, PTB, PR, PRB e PCdoB (este, do deputado Aldo Rebelo, relator do Código aprovado na Câmara), os governistas têm 56 das 81 cadeiras da Câmara Alta.
Ainda que seja ingenuidade imaginar o pleno atendimento a produtores e ambientalistas, é imperativo encontrar o equilíbrio que permita conciliar o agronegócio com a defesa do meio ambiente. O Brasil ganhou posição de destaque na última década do século passado, com a Eco-92, exatamente por conduzir a convenção das Nações Unidas que reuniu no Rio de Janeiro representantes de 179 países (em 1992) com a firme intenção de produzir leis que assegurem o desenvolvimento sustentável, harmonizando o crescimento econômico e social com a preservação ambiental. Esse é o único caminho seguro para o planeta Terra, já tão abalado pelos erros pretéritos.

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